quarta-feira, 13 de abril de 2011

Homicídio doloso contra chefes dos Poderes da União

Homicídio doloso contra chefes dos Poderes da União

Juliano de Camargo
Bacharel em direito, pós-graduando em direito público, Assistente Jurídico do Ministério Público


Crime doloso contra a vida de tais autoridades nacionais - Presidentes da República, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do Supremo Tribunal Federal - é tipificado especificamente no artigo 29, cc. artigo 26, ambos da Lei 7.170/1983 – que define os crimes contra a segurança nacional.

O artigo 1º da Lei de Segurança Nacional define seus objetivos primordiais, que são a preservação da integridade territorial e da soberania nacional, do regime democrático e do estado de direito, e proteção à pessoa dos chefes dos poderes do Estado.[1]

Todavia, há que se observar que essa lei também prevê como requisitos, principalmente no caso de conflito de normas, a motivação e objetivos do agente e a lesão real ou potencial aos bens jurídicos tutelados (art. 2º).[2]

Consequentemente, caso a consumação ou tentativa de homicídio contra os chefes dos poderes – presidente da república, da Câmara dos Deputados, do Senado ou STF – tenha motivação política de desestruturar o Estado, por certo será enquadrada na Lei de Segurança Nacional, nos termos do artigo 29, com remissão do artigo 26[3].

Art. 29 - Matar qualquer das autoridades referidas no art. 26. Pena: reclusão, de 15 a 30 anos.

Ademais, a pena é mais gravosa do que aquela prevista para o homicídio qualificado, que é de 12 a 30 anos.

A apuração do fato será instaurada em inquérito policial de atribuição da Polícia Federal, com possibilidade de delegação para o Estado-membro.[4]

Tema polêmico refere-se à competência para processar e julgar tais delitos contra a segurança nacional.

Prevê o artigo 30 da Lei 7.170/1983 que “Compete à Justiça Militar processar e julgar os crimes previstos nesta Lei, com observância das normas estabelecidas no Código de Processo Penal Militar, no que não colidirem com disposição desta Lei, ressalvada a competência originária do Supremo Tribunal Federal nos casos previstos na Constituição.”

Porém, a Constituição Federal de 1988 limitou a competência da Justiça Militar ao julgamento dos crimes exclusivamente militares[5], em razão do que deve-se reputar revogado tacitamente esse artigo 30.

Socorrendo-se ao texto constitucional, verifica-se que a atribuição de competências para o julgamento de infrações penais leva em conta não a pessoa da vítima, mas o agente e suas prerrogativas inerentes ao cargo.

Resta, portanto, considerando a qualidade dos chefes dos poderes, objeto de tutela de interesse nacional, aplicação do disposto no artigo 109, inciso IV, da CF, que define a competência da Justiça Federal:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;

Em síntese, a prática de homicídio doloso, com motivação política, em atentado à segurança nacional, não é crime previsto no artigo 121 do Código Penal, mas sim no artigo 29 da Lei 7170/1983, com pena de 15 a 30 anos de reclusão, de competência da Justiça Federal, observando-se, por certo, o Tribunal do Júri (art. 5º, XXXVIII, “d”, CF).



[1] LSN Art. 1º - Esta Lei prevê os crimes que lesam ou expõem a perigo de lesão:
I - a integridade territorial e a soberania nacional;
Il - o regime representativo e democrático, a Federação e o Estado de Direito;
Ill - a pessoa dos chefes dos Poderes da União.

[2] LSN Art. 2º - Quando o fato estiver também previsto como crime no Código Penal, no Código Penal Militar ou em leis especiais, levar-se-ão em conta, para a aplicação desta Lei:
I - a motivação e os objetivos do agente;
II - a lesão real ou potencial aos bens jurídicos mencionados no artigo anterior.

[3] LSN Art. 26 - Caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação.

[4] LSN Art. 31 - Para apuração de fato que configure crime previsto nesta Lei, instaurar-se-á inquérito policial, pela Polícia Federal:
Parágrafo único - Poderá a União delegar, mediante convênio, a Estado, ao Distrito Federal ou a Território, atribuições para a realização do inquérito referido neste artigo.

[5] CF Art. 124: À Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei.